sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Sê senhor da tua vontade e escravo da tua consciência

Já dizia Aristóteles, 350 anos antes de Cristo.

A mobilização popular ocorrida com os julgamentos dos casos CNJ e Ficha Limpa trouxeram benefícios ao país que extrapolaram os das causas em si. Mais do que simplesmente prestar atenção nas decisões do Supremo Tribunal Federal, passamos a conhecer os ministros individualmente por meio de suas decisões e a formar opiniões sobre determinados comportamentos desses magistrados.

Há pouco tempo, nós inferiores e ignorantes, ainda éramos censurados quando nos pronunciávamos a respeito das decisões do deuses do STF. Nossas opiniões e desaprovações eram avaliadas pelos entendidos como uma espécie de heresia, fazendo com que nos recolhêssemos à nossa própria insignificância. No entanto, hoje estamos finalmente entendendo que, se somos os beneficiados ou punidos com a ação da justiça, nada mais natural do que nos manifestarmos contra ou a favor das decisões que envolvem os nossos destinos como cidadãos brasileiros. Podemos ser leigos em matéria de leis, mas somos experts no sentimento de justiça, desde que isentos de interesses pessoais. Não foram os magistrados que criaram a justiça, mas sim o nosso desejo de fazê-la valer para evitar desequilíbrios entre os poderes e a desigualdade social.

Como descreve a própria missão do ministério: "O Ministério da Justiça tem por missão garantir e promover a cidadania, a justiça e a segurança pública, através de uma ação conjunta entre o Estado e a sociedade." Oras... e o que significa "ação conjunta" senão a participação das duas partes envolvidas e que não se limite à imposição de uma e ao obedecimento da outra? Não estou me referindo ao cumprimento das decisões dos tribunais, mas do nosso direito à contestação respaldado pela garantia constitucional de livre expressão.

Fiz esta longa introdução para comentar a avaliação de alguns ministros do STF no julgamento do caso de trabalho escravo na fazenda do senador João Ribeiro situada no município de Piçarra, no Pará, onde 35 trabalhadores eram submetidos à condição análoga à de escravos, conforme constatado pelo Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho. Por 7 votos a 3, o Supremo Tribunal Federal acolheu nesta quinta-feira denúncia do Ministério Público Federal contra o senador, proprietário daquela fazenda. Os três votos contrários foram dados pelos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Marco Aurélio, alegando entre outros motivos, os da falta de comprovação do trabalho escravo e até da identificação de tendências ideológicas nas constatações feitas pelo Ministério Público.

No caso de Gilmar Mendes, já nos acostumamos com seus comentários generalizadores como os que ele fez no julgamento da lei do Ficha Limpa, dizendo que a opinião pública não sabe o que é melhor para o país porque aplaude a invasão de barracos e que não é função do STF bater palmas para malucos dançarem. Nesse caso específico de trabalho escravo, disse que não se constatou que tenha sido violado, no caso, o direito de ir e vir dos trabalhadores rurais, o que, para ele, é condição fundamental para a caracterização desse tipo de crime. Se as provas reunidas na fase preliminar de investigação apontaram para jornada exaustiva, restrição de locomoção, servidão por dívida e falta de cumprimento de promessas salariais e obrigações trabalhistas, como Gilmar Mendes pode afirmar que não havia provas de trabalho escravo? Descontar comida e até as ferramentas de trabalho do salário desses trabalhadores deixando-os compulsoriamente endividados ao ponto de não poderem sair é o que? Pior ainda foi a observação que ele fez de que as condições em que se encontravam os empregados não eram "degradantes", tendo em vista a "realidade local". Com essa declaração o ministro acaba de criar a teoria da relatividade para a dignidade do homem, para a condição de trabalho escravo e para o conceito republicano de igualdade.

O ministro Marco Aurélio seguiu o voto de Gilmar Mendes alegando que a fazenda estava apenas a 6 quilômetros de distância de Boa Vista. Dá até pra ir a pé, né, ministro?

Já Dias Toffoli veio com a conversa de fiada de "ideologização", como se a dignidade do homem tivesse sido inventada pelo socialismo marxista e posteriormente registrada em cartório. Faltou dizer que não se pode usufruir de liberdade, igualdade e fraternidade porque são do iluminismo, ou que a compaixão é de propriedade das religiões.

Enfim, a cada votação do STF conhecemos cada ministro em particular pela maneira como vota e como defende o seu voto. Devagarinho vamos formando os nossos conceitos e identificando as tendências e pensamentos de cada um deles. Um dia, quem sabe, chegaremos ao ponto de poder escolher e vetar diretamente os ministros escolhidos, pois, o Congresso até agora não se mostrou competente para sabatinar e avaliar os escolhidos. Pelo visto o apoio político incondicional é um pedido sutil de clemência antecipada para suprir eventuais necessidades futuras.

Continuemos acompanhando o STF e, principalmente, nos manifestando sobre as suas decisões.


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Sê senhor da tua vontade e escravo da tua consciência

Já dizia Aristóteles, 350 anos antes de Cristo.

A mobilização popular ocorrida com os julgamentos dos casos CNJ e Ficha Limpa trouxeram benefícios ao país que extrapolaram os das causas em si. Mais do que simplesmente prestar atenção nas decisões do Supremo Tribunal Federal, passamos a conhecer os ministros individualmente por meio de suas decisões e a formar opiniões sobre determinados comportamentos desses magistrados.

Há pouco tempo, nós inferiores e ignorantes, ainda éramos censurados quando nos pronunciávamos a respeito das decisões do deuses do STF. Nossas opiniões e desaprovações eram avaliadas pelos entendidos como uma espécie de heresia, fazendo com que nos recolhêssemos à nossa própria insignificância. No entanto, hoje estamos finalmente entendendo que, se somos os beneficiados ou punidos com a ação da justiça, nada mais natural do que nos manifestarmos contra ou a favor das decisões que envolvem os nossos destinos como cidadãos brasileiros. Podemos ser leigos em matéria de leis, mas somos experts no sentimento de justiça, desde que isentos de interesses pessoais. Não foram os magistrados que a criaram a justiça, mas sim o nosso desejo de fazê-la valer para evitar desequilíbrios entre os poderes e a desigualdade social.

Como descreve a própria missão do ministério: "O Ministério da Justiça tem por missão garantir e promover a cidadania, a justiça e a segurança pública, através de uma ação conjunta entre o Estado e a sociedade." Oras... e o que significa "ação conjunta" senão a participação das duas partes envolvidas e que não se limite à imposição de uma e ao obedecimento da outra? Não estou me referindo ao cumprimento das decisões dos tribunais, mas do nosso direito à contestação respaldado pela garantia constitucional de livre expressão.

Fiz esta longa introdução para comentar a avaliação de alguns ministros do STF no julgamento do caso de trabalho escravo na fazenda do senador João Ribeiro situada no município de Piçarra, no Pará, onde 35 trabalhadores eram submetidos à condição análoga à de escravos, conforme constatado pelo Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho. Por 7 votos a 3, o Supremo Tribunal Federal acolheu nesta quinta-feira denúncia do Ministério Público Federal contra o senador, proprietário daquela fazenda. Os três votos contrários foram dados pelos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Marco Aurélio, alegando entre outros motivos, os da falta de comprovação do trabalho escravo e até da identificação de tendências ideológicas nas constatações feitas pelo Ministério Público.

No caso de Gilmar Mendes, já nos acostumamos com seus comentários generalizadores como os que ele fez no julgamento da lei do Ficha Limpa, dizendo que a opinião pública não sabe o que é melhor para o país porque aplaude a invasão de barracos e que não é função do STF bater palmas para malucos dançarem. Nesse caso específico de trabalho escravo, disse que não se constatou que tenha sido violado, no caso, o direito de ir e vir dos trabalhadores rurais, o que, para ele, é condição fundamental para a caracterização desse tipo de crime. Se as provas reunidas na fase preliminar de investigação apontaram para jornada exaustiva, restrição de locomoção, servidão por dívida e falta de cumprimento de promessas salariais e obrigações trabalhistas, como Gilmar Mendes pode afirmar que não havia provas de trabalho escravo? Descontar comida e até as ferramentas de trabalho do salário desses trabalhadores deixando-os compulsoriamente endividados ao ponto de não poderem sair é o que? Pior ainda foi a observação que ele fez de que as condições em que se encontravam os empregados não eram "degradantes", tendo em vista a "realidade local". Com essa declaração o ministro acaba de criar a teoria da relatividade para a dignidade do homem, para a condição de trabalho escravo e para o conceito republicano de igualdade.

O ministro Marco Aurélio seguiu o voto de Gilmar Mendes alegando que a fazenda estava apenas a 6 quilômetros de distância de Boa Vista. Dá até pra ir a pé, né, ministro?

Já Dias Toffoli veio com a conversa fiada de "ideologização", como se a dignidade do homem tivesse sido inventada pelo socialismo marxista e posteriormente registrada em cartório. Faltou dizer que não se pode usufruir de liberdade, igualdade e fraternidade porque são do iluminismo, ou que a compaixão é de propriedade das religiões.

Enfim, a cada votação do STF conhecemos cada ministro em particular pela maneira como vota e como defende o seu voto. Devagarinho vamos formando os nossos conceitos e identificando as tendências e pensamentos de cada um deles. Um dia, quem sabe, chegaremos ao ponto de poder escolher e vetar diretamente os ministros escolhidos, pois, o Congresso até agora não se mostrou competente para sabatinar e avaliar os escolhidos. Pelo visto o apoio político incondicional é um pedido sutil de clemência antecipada para suprir eventuais necessidades futuras.

Continuemos acompanhando o STF e, principalmente, nos manifestando sobre as suas decisões.


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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Lei do aborto: pecado é não fazer nada

Estávamos hoje discutindo no Twitter sobre um texto do jornalista Ricardo Noblat sobre a lei do aborto. Não vou entrar nessa discussão religiosa sobre o tema, pois, quando falamos sobre a morte de 2 milhões de mulheres, discutir teologia e moralismo é estupidez. No Brasil costuma-se concentrar o foco na discussão política, pois, para eles ela é a batalha que vale e o ser humano passa para segundo plano quando deveria ficar em primeiro.

No caso da AIDS, por exemplo, as ocorrências reduziram drasticamente após as campanhas de conscientização, quando ainda não havia medicamentos que permitissem a sobrevida dos pacientes aidéticos. Duvido que alguma religião impeça ou se posicione contra a iniciativa de uma campanha esclarecedora sobre os riscos do aborto feito em clínicas ilegais, sem o apelo religioso ou moralista que nesse caso prático serve apenas como complicador.

Em relação às verbas para campanhas publicitárias, apenas para termos uma ideia dos montantes normalmente gastos, reproduzo abaixo parte da matéria "Não existe comprometimento com a Nação" do Jornal Tribuna União:
"Em 2009, segundo dados da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Governo Federal gastou em campanhas publicitárias R$ 1.67 bilhão. O Governo do Estado de São Paulo gastou, em 2010, R$ 266,6 milhões. A Prefeitura São Paulo, R$ 110 milhões. O Estado de Alagoas, pequeno e pobre, gasta em média, para promover a sua administração, R$ 3.000 milhões mês."
Todos concordam que cada vida salva é importante e nesse caso em que morreram 2 milhões de mulheres em 110 meses (200 mil por ano), 1% delas conscientizadas representaria 2000 vidas salvas por ano.

Acho que os políticos que se opõe à lei de legalização do aborto, seja por questões morais ou religiosas, deveriam aproveitar este ponto de convergência e criar lei que obrigasse o governo a destinar parte das verbas da saúde e da comunicação social para uma campanha nacional de conscientização sobre os riscos do aborto clandestino, ao invés de usar o nosso dinheiro para propagandas eleitoreiras. Com lei do aborto aprovada ou não, pode-se fazer MUITA coisa ao invés de ficar discutindo o sexo dos anjos enquanto milhares de seres humanos morrem por ano por falta, principalmente, de esclarecimentos. Partir para o lado prático como se fez com a AIDS ao invés de ficar brigando e fazendo beicinho.

Importa mesmo o que pode ser feito IMEDIATAMENTE para salvar vidas, sem discussões improdutivas. Ou será que esses cristãos, paradoxalmente ao que leem e pregam em suas religiões, são a favor de se condenar e apedrejar essas que eles consideram as "Madalenas" do século XXI?

E termino este post com o famoso trecho da "Meditation XVII" de John Donne:
"Nenhum homem é uma ilha, completa em si mesma; todo homem é um pedaço do continente, uma parte da terra firme. Se um torrão de terra for levado pelo mar, a Europa fica menor, como se tivesse perdido um promontório, ou perdido o solar de um teu amigo, ou o teu próprio. A morte de qualquer homem diminui a mim, porque na humanidade me encontro envolvido; por isso, nunca mandes indagar por quem os sinos dobram; eles dobram por ti. "

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Aborto: crime é não fazer nada!

Estávamos hoje discutindo no Twitter após um post do senador Demóstenes Torres sobre um texto do jornalista Ricardo Noblat sobre a lei do aborto. Não vou entrar nessa discussão religiosa sobre o tema, pois, quando falamos sobre a morte de 2 milhões de mulheres, discutir teologia e moralismo é estupidez. No Brasil costuma-se concentrar o foco na discussão política, pois, para eles ela é a batalha que vale e o ser humano passa para segundo plano quando deveria ficar em primeiro.

No caso da AIDS, por exemplo, as ocorrências reduziram drasticamente após as campanhas de conscientização, quando ainda não havia medicamentos que permitissem a sobrevida dos pacientes aidéticos. Duvido que alguma religião impeça ou se posicione contra a iniciativa de uma campanha esclarecedora sobre os riscos do aborto feito em clínicas ilegais, sem o apelo religioso ou moralista que nesse caso prático serve apenas como complicador.

Em relação às verbas para campanhas publicitárias, apenas para termos uma ideia dos montantes normalmente gastos, reproduzo abaixo parte da matéria "Não existe comprometimento com a Nação" do Jornal Tribuna União:
"Em 2009, segundo dados da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República, Governo Federal gastou em campanhas publicitárias R$ 1.67 bilhão. O Governo do Estado de São Paulo gastou, em 2010, R$ 266,6 milhões. A Prefeitura São Paulo, R$ 110 milhões. O Estado de Alagoas, pequeno e pobre, gasta em média, para promover a sua administração, R$ 3.000 milhões mês."
Todos concordam que cada vida salva é importante e nesse caso em que morreram 2 milhões de mulheres em 110 meses (200 mil por ano), 1% delas conscientizadas representaria 2000 vidas salvas por ano.

Acho que os políticos que se opõe à lei de legalização do aborto, seja por questões morais ou religiosas, deveriam aproveitar este ponto de convergência e criar lei que obrigasse o governo a destinar parte das verbas da saúde e da comunicação social para uma campanha nacional de conscientização sobre os riscos do aborto clandestino, ao invés de usar o nosso dinheiro para propagandas eleitoreiras. Com lei do aborto aprovada ou não, pode-se fazer MUITA coisa ao invés de ficar discutindo o sexo dos anjos enquanto milhares de seres humanos morrem por ano por falta, principalmente, de esclarecimentos. Partir para o lado prático como se fez com a AIDS ao invés de ficar brigando e fazendo beicinho.

Importa mesmo o que pode ser feito IMEDIATAMENTE para salvar vidas, sem discussões improdutivas. Ou será que esses cristãos, paradoxalmente ao que leem e pregam em suas religiões, são a favor de se condenar e apedrejar essas que eles consideram as "Madalenas" do século XXI?

E termino este post com o famoso trecho da "Meditation XVII" de John Donne:
"Nenhum homem é uma ilha, completa em si mesma; todo homem é um pedaço do continente, uma parte da terra firme. Se um torrão de terra for levado pelo mar, a Europa fica menor, como se tivesse perdido um promontório, ou perdido o solar de um teu amigo, ou o teu próprio. A morte de qualquer homem diminui a mim, porque na humanidade me encontro envolvido; por isso, nunca mandes indagar por quem os sinos dobram; eles dobram por ti. "

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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Desejos

Disse o poeta romano Ovídio: "Esforçamo-nos sempre para alcançar o proibido e desejamos o que nos é negado."

Se as nossas conquistas nascem dos nossos desejos, deles também nascem as nossas frustrações e infelicidades. A obstinação pela busca do objeto do desejo é tão prejudicial quanto a inércia ou a apatia resultantes do desinteresse por velhos ou novos desafios. Não é fácil saber o momento certo de parar, desistir ou esperar; não é fácil empenhar o esforço adequado para retomar, insistir e progredir. Nada é impossível, mas nada também é fácil. E assim vamos caminhando no processo evolutivo, tanto profissional quanto pessoal e espiritual, vencendo algumas batalhas e perdendo outras. Embora às vezes nos pareça, a verdade é que ninguém para, mas anda conforme sua consciência, estímulos e forças. Os obstáculos são os mesmos e não mudam; o que muda é o nosso ânimo relacionado às pretensões dos nossos desejos e aos resultados das nossas tentativas.

O filósofo Arthur Schopenhauer discorre sobre a relação "Desejo e posse" em "A Arte de Ser Feliz":

"Um homem não se sente totalmente privado dos bens aos quais nunca sonhou aspirar e é feliz mesmo sem eles, enquanto o outro que os possua cem vezes mais do que o primeiro, sente-se infeliz quando lhe falta uma única coisa que tenha desejado. Cada um tem seu próprio horizonte daquilo que lhe é possível atingir, e suas pretensões têm uma extensão proporcional a esse horizonte." 
"Quando um determinado objeto que se encontra dentro desses seus limites se apresenta e o faz acreditar na possibilidade de alcançá-lo, o homem sente-se feliz; em contrapartida, sentir-se-á infeliz diante das eventuais dificuldades que colocarem em risco tal possibilidade. Tudo o que estiver situado externamente a esse campo visual não atuará de forma alguma sobre ele. Por esse motivo, as grandes propriedades dos ricos não perturbam os pobres, e, por outro lado, para o rico cujos propósitos tenham fracassado, serve-lhe de consolo as muitas coisas que já possui. (A riqueza assemelha-se à água do mar; quanto mais dela se bebe, mais sede se tem. O mesmo vale para a glória)."
"A fonte da nossa insatisfação reside nas nossas tentativas continuamente renovadas de aumentar o limite das nossas pretensões, enquanto o fator que o impede permanece imutável."

Só teria uma coisa a observar diante dessas reflexões: Parar um pouco diante do obstáculo a ser superado, procurar aprender a cada tentativa frustrada, reavaliar padrões repetitivos antes das novas tentativas. E por que não, refazer a nossa ordem de valores?


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sábado, 18 de fevereiro de 2012

Ceticismo ou teimosia?

Muitos se assustam e rejeitam a leitura de textos que falem sobre espiritualidade, mas há uma explicação muito simples para essas reações. As religiões exploraram tanto esse tema de uma forma tão incoerente que afastaram as pessoas mais racionais e pragmáticas da busca espiritual. Vários são os motivos que levaram essas pessoas a esse ceticismo, que vão das incoerências nas atitudes dos religiosos em relação aos seus discursos, aos interesses econômicos exacerbados de suas religiões. Do lado econômico, não me refiro à importância do dinheiro neste mundo terreno para que as religiões possam fazer o seu trabalho e manter suas estruturas, mas sim do foco excessivo nos bens de capital sem a devida aplicação proporcional na disseminação de seus princípios e na exploração financeira de seu seguidores.

As religiões não acompanharam a evolução cultural do ser humano e da sociedade em que ele vive com medo de perderem a "coerência" com seus princípios e, consequentemente, o poder sobre  suas "ovelhas". Quanto mais rígidos e reacionários os princípios de uma religião, maiores são as oportunidades de ações hipócritas de seus representantes, fazendo com que seja constante a procura dessas ovelhas por pastos onde a tolerância seja mais viçosa.

E o cético, por sua vez, nega a existência de seu lado mais sutil, movido pela sua rejeição a todo esse sistema que tenta monopolizar a verdade e, por conseguinte, o caminho para o desenvolvimento de sua espiritualidade latente. Se ao menos ele desse mais atenção à sua intuição e não a encobrisse com a racionalidade excessiva, com sua alma livre de preconceitos poderia experimentar outras sutilezas do corpo e da mente, ou seja, perceber-se mais do que se percebe.

Se não bastasse isto, o cético é tão racional que quando chega no fim da vida e se vê obrigado a mudar sua visão da existência humana, acaba descartando essa última oportunidade de reavaliar sua ordem de valores e conceitos por acreditar que sua fragilidade física com a proximidade da morte o está tornando mais sentimental e, portanto, sujeito às crises de nostalgia e arrependimentos.

Escreveu Albert Einstein: "(...) agora que envelheci, passei a olhar a morte como uma dívida antiga que é preciso, afinal, saldar. Contudo, instintivamente, faz-se quanto é possível para delongar esse acontecimento. Tal é o jogo que a natureza joga conosco. Podemos achar graça por assim ser, mas não conseguimos libertar-nos do instinto de sobrevivência a que todos estamos presos."

Esta necessidade de reavaliar conceitos não pode ser interpretada como esperança de vida após a morte ou alguma espécie de consolo. Independentemente da crença em algo superior (não necessariamente na figura de um deus sentado em seu trono, mas de uma energia "creadora" amórfica), por que não tentar descobrir essas sutilezas ainda inexplicáveis (e não mesmo) pela limitadíssima ciência dos homens nesse campo do sutil?

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Ficha Limpa - Vivas e calma! Estamos apenas começando.

Aprovada a lei da Ficha Limpa, renovam-se as esperanças no STF como guardião não só da constituição, mas também de sua interpretação em consonância com a vontade do povo. Infelizmente a lei não estende o impedimento para cargos do executivo, o que garantiria o total afastamento dos fichas sujas da política, eliminando de vez os pagamentos de favores prestados por algumas personagens já conhecidas nesse meio. Essas insistentes figuras inda permanecerão por algum tempo no cenário político, mas tendem a desaparecer por falta de uso. No entanto, que comemoremos a etapa vencida e deixemos momentaneamente de lado o perfeccionismo.

São duas lições importantes que aprendemos. A primeira é a de que o povo alcança vitórias quando se mobiliza, a despeito das manifestações elitistas de alguns ministros do Supremo que se comportam como se pertencessem à uma casta, não de notório saber jurídico, mas de seres dotados da capacidade incomum  de julgar o que a plebe deve ou não querer. Justificaria este meu comentário com vários trechos de discursos de alguns ministros que votaram contra, mas cito dois do ministro Gilmar Mendes ao dizer que o mesmo povo que aplaude a entrada da polícia nas favelas para matar não tem discernimento para desejar a aprovação da Ficha Limpa ("bater palmas para maluco dançar") e que a opinião pública é relativa. Pois é, cara pálida, são esses malucos que pagam os salários de "vossas excelências" para que nos defendam das injustiças, interpretando a essência da Constituição ao invés de agirem como guardiões da literalidade constitucional.

A segunda lição é para os fanáticos, os porta-bandeiras, torcedores partidários que defendem seus partidos e políticos do coração mesmo que assaltem o erário, o dinheiro dos impostos que pagamos e que deveria retornar em forma de benefícios para a saúde, segurança, habitação, educação entre outros. Pergunto para esses otários-úteis:
-Você viu seu político defendendo a Ficha Limpa antes ou durante o julgamento e nos felicitando pela vitória após a aprovação?
Se existiram foram pouquíssimos, mas mesmo assim tenho certeza de que muitos fanáticos dirão que se tratou de ética "profissional"... ética nada, isso se chama C O R P O R A T I V I S M O . E para quem não entende os malefícios do corporativismo, vou explicar mostrando como funciona a ordem de valores do político convencional:
1º - Preferência para si mesmo;
2º - Preferência para seu partido;
3º - Preferência para os partidos da aliança;
4º - Preferência para a classe, independentemente de partidos e alianças;
5º - Preferência para o povo em ano eleitoral para garantir a boquinha.
Que continuemos acreditando que é possível mudar, aderindo a movimentos que visem a moralização política do país, sabendo separar os interesseiros dos interessados e nos atualizando sempre da lista dos Fichas Sujas para que não sejam premiados com cargos no executivo.


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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Ficha Limpa - quem julga os ministros?

TWITAÇO DIA 15/02

#fichalimpaja

Amanhã, 15 de fevereiro, o STF votará a Ficha Limpa. O Brasil precisa que essa lei seja aprovada para as eleições de outubro deste ano. Não vou entrar no mérito jurídico porque não sou competente para isso, mas posso entrar em todos os outros méritos que envolvam os prejuízos morais e financeiros que continuarão rolando no país se essa lei não for aprovada.

Será a continuidade da desfaçatez, da impunidade e de todos os outros efeitos e defeitos colaterais resultantes da corrupção já quase institucionalizada em nosso país. Sim... institucionalizada porque a justiça não está mais se limitando a julgar conforme a nossa Constituição, mas enxergando saídas constitucionais para o roubos do erário, ou seja, dá a impressão de que o STF se transformou numa espécie de advogado de defesa do lesa-pátria.

Duas frases de filósofos resumem conselhos sábios para os ministros do Supremo Tribunal:
  • Para o tecnicismo sem a razão: "A justiça inflexível é frequentemente a maior das injustiças." (Terêncio)
  • Para a razão sem humanismo: "Não podemos ser justos se não formos humanos." (Luc de Clapiers Vauvenargues)
Para os que nunca leram a Constituição sobre as obrigações do STF, Seção II - DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, artigo 102: "Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição (...)"

E como guardá-la se os argumentos do tecnicismo interpretativo não forem comparados com a essência do sentimento humanista presente nos seguintes termos da mesma Constituição:

(...)
  • Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
(...)
  • Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
  • I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;
  • II - garantir o desenvolvimento nacional;
  •  III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
  • IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Por que para alguns ministros do Supremo, as únicas subjetividades admitidas para decisões de inconstitucionalidade estão em algumas seções, artigos e parágrafos que eles "conseguem" enxergar seletivamente, menos nas entrelinhas do artigo 3º que citei acima?

Sim, nós temos que pressionar e a pressão faz parte da liberdade de se expressar contra a indignação. Qualquer leigo pode entender esse nosso direito constitucional.

Dia 15 será o dia "D" para sabermos de que lado a justiça brasileira está. O julgamento supremo é do povo, sem direito a recursos.


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domingo, 12 de fevereiro de 2012

Escolhas 2

O tema "escolha" é tão abrangente que precisamos organizá-lo antes de discorrer sobre ele. Nos primeiros anos de vida não temos quase nenhum direito à escolha, mas à medida que crescemos nos deparamos com escolhas a todo instante. A escolha é sempre um peso, seja no momento ou após a decisão, pois, como disse o filósofo Henri Bergson, "escolher é excluir" e não há exclusão sem arrependimento. Como jamais teremos certeza do que teria ocorrido se a escolha tivesse sido outra, seremos torturados pela eterna dúvida caso não nos posicionemos adequadamente em relação ao objetivo maior que temos em nossas vidas.

Utilizando uma linguagem metafórica para entender o significado de "objetivo maior", seria como decidir subir ao topo de uma montanha desconhecida para apreciar a paisagem lá de cima ou o percurso. Quando estamos na base da montanha não enxergamos o topo, não conhecemos o caminho e nem temos ideia de quantas horas vamos caminhar para chegar. Pegamos a trilha de subida mais evidente e vamos caminhando com segurança até a primeira encruzilhada, momento em que faremos nossa primeira escolha. Podemos ter escolhido o caminho mais longo, porém o mais belo, mas se o nosso desejo era o de chegar depressa no topo, ficaremos praguejando o tempo todo, nos privando de ouvir cantos de pássaros, ver árvores floridas e de sentir a brisa da montanha. Como escreveu Tolstoi, "Há quem passe pelo bosque e apenas veja lenha para fogueira".

Quando buscamos a melhoria da nossa essência (ou espiritualidade), as escolhas "erradas" devem ser entendidas como parte do aprendizado e não simplesmente aceitas com resignação, pois, resignar-se é reconhecer a existência de uma punição dada por ordem superior ou fruto do destino traçado. Não há punição, não há ordem superior que a determine e o nosso destino somos nós quem o traçamos. O único destino certo está na finitude da existência física. Há escolhas... tão somente e simplesmente escolhas... nossas escolhas. "Deus não é culpado. A culpa [se houver] é de quem escolhe." (Platão)

Tendemos a buscar, inconscientemente, os golpes de intensidades precisas do martelo que modela a nossa alma.

Leia Também: Do mal, muita coisa boa resultou (Carl Jung)
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quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Asas de Deus

Não costumo postar e-mails coletivos recebidos, mas este merece destaque, pelo conjunto da arte e da mensagem. Nem preciso escrever mais neste post.




"Depois de um incêndio florestal no Parque Nacional de Yellowstone, guardas florestais começaram a sua caminhada até uma montanha para avaliar os danos do inferno e Umranger encontrou um pássaro literalmente petrificado em cinzas, empoleirado statuesquely no chão na base de uma árvore. Um pouco enojado com a visão misteriosa, ele derrubou o pássaro com uma vara. Quando ele bateu nela delicadamente, três filhotes minúsculos correram sob as asas de sua mãe morta. A mãe amorosa,em plena consciência do desastre iminente, tinha levado seus filhos para a base da árvore e reuniu-os debaixo das asas, instintivamente sabendo que a fumaça tóxica subiria. Ela poderia ter voado para a segurança, mas se recusou a abandonar seus bebês. Em seguida, o incêndio chegou e o calor tinha queimado seu corpo pequeno, a mãe havia permanecido firme ... porque ela tinha se disposto a morrer, assim que aqueles sob a cobertura de suas asas viveriam."














Sobre a autora das pinturas:  Julie Thompson passou grande parte da sua vida no Alasca. Usufruindo de um cenário natural único e inspirador, que está presente no seu trabalho artístico, começou a pintar penas em 1990, na tentativa de reutilizar as penas que os pavões de sua mãe perdiam em certas épocas do ano.

Conhecedora de técnicas de desenho a caneta, pois Julie trabalhou como ilustradora numa empresa de arqueologia, depressa descobriu que os traços pequenos e finos se adaptavam bem às penas. Entusiasmou-se com a ideia, pois nunca vira penas pintadas e pensou que seria um trabalho original e gratificante. A pintura das penas, onde ela retrata animais e pessoas é um trabalho moroso, chegando a demorar algumas semanas para concluir uma única peça.

Julie vive actualmente na região de Puget Sound, Washington, com o marido e dois filhos e não há outro lugar onde gostasse tanto de morar!

domingo, 5 de fevereiro de 2012

A História não questionada

Hoje eu estava lendo uma interessante matéria do jornalista Lorenzo Aldé na edição de 2008 da revista História da Biblioteca Nacional com o título "Cadê a História que estava aqui?". Considero o senso crítico uma prática fundamental em qualquer leitura. Infelizmente a palavra "crítica" assumiu diversos significados que desencorajam as pessoas de questionar o que lêem, receosos de serem chamados de "hereges" e esse medo infundado as fazem engolir muitas coisas sem digerir.

O problema já começa com a história contada nas escolas, quando somos forçados a ler ou a decorar verdades para irmos bem nas provas. Nessa idade o nosso senso crítico ainda em desenvolvimento é sufocado pelos certos e errados que nos são impostos. E assim vamos crescendo com nossas mentes limitadas por padrões de comportamento e pelo dualismo, muitas vezes nos impedindo de experimentar o saudável exercício de tirar nossas próprias conclusões. O pior de tudo é ainda defender o que nos foi imposto sem admitir a possibilidade de rever nossos conceitos.

Num trecho dessa matéria de Lorenzo Aldé, ele faz uma abordagem sobre a figura de Getúlio Vargas e a história:


(...) Mitos, lendas e incorreções sobre a formação e a identidade nacionais povoam o imaginário coletivo. Muitas vezes a versão se sobrepõe ao fato, seja pela disseminação de interpretações equivocadas, seja pela dificuldade de se definir, preto no branco, o que é a verdade neste país de memórias “mestiças”.


Bom exemplo é a figura de Getúlio Vargas. Ditador simpatizante dos ideais fascistas ou defensor dos trabalhadores? Entre os dois extremos do mesmo personagem, é difícil equilibrar-se numa visão isenta. “É quase uma ofensa falar mal de Vargas”. Comenta a professora Mariana de Melo, baseada em sua experiência com turmas de um curso noturno em uma escola estadual do Rio de Janeiro. Não adianta descrever em detalhes as arbitrariedades do Estado Novo (1937-1945), a censura, a perseguição política. “Mas, professora, ele criou as leis trabalhistas”, retrucam os alunos. Para ela, uma postura compreensível: “Dentro da perspectiva dessa camada social, isso é o mais importante”, pondera a professora, dizendo ser espinhosa também a missão de mostrar aos alunos que as benesses sociais trazidas por Vargas não foram fruto de sua generosidade pessoal, mas resultado de um processo histórico inevitável.


Se entre adultos é complicado esclarecer contradições desse tipo, que dirá entre as crianças e adolescentes. Este público está habituado a interpretar histórias que tenham vilões de um lado e heróis de outro. “Tem que ter uma definição: é bom ou é mau?”, sintetiza a professora Joana Ferraz de Abreu, que leciona em escolas particulares do Rio. Por isso, ensinar Getúlio também dá trabalho, assim como os episódios da História Mundial. A Alemanha é a vilã da guerra, mas a Inglaterra também tinha campos de concentração. Claro que tudo depende de que lado do front o país esteve e de quem saiu vitorioso. “As crianças americanas, por exemplo, dificilmente aprendem muito sobre a bomba atômica”, compara.


No Brasil, o ato bárbaro cometido pelos Estados Unidos contra Hiroshima e Nagasaki no fim da Segunda Guerra Mundial tem espaço na sala de aula. E repercute até demais, pois o antiamericanismo anda em voga entre os mais jovens. É um dos preconceitos que prejudicam uma compreensão imparcial dos acontecimentos. (...)

Já vimos políticos brigando entre si pela posse de Vargas para seus partidos (PDT e PTB), mas será que é um bom negócio ter Getúlio como patrono?

As pessoas PRECISAM DE HERÓIS porque não conseguem enxergar o herói que existe dentro delas, já dizia Nietzsche. Além do mais, não se consegue ir a fundo nas reais intenções do herói construído, principalmente após a sua morte. Há um misto de medo e respeito em contestar a vida de celebridades porque a morte santifica a sua imagem, ficando a história contada pelos que lhes foram próximos. E Nietzsche ia mais longe em "Para além do bem e do mal" (1) e "A Vontade de Poder"(2):

  1. "Como? Um grande homem? Eu apenas vejo o ator representando o seu próprio ideal"
  2. "Todo o grande homem é, necessariamente, cético, ainda que possa não o mostrar: pelo menos se a grandeza dele consistir em querer uma coisa grande e grandes meios para realizá-la. A liberdade em relação a todas as convicções faz parte da sua vontade: o que está em conformidade com o "despotismo esclarecido" que todas as grandes paixões exercem."
E assim a história formal vai sendo contada e escrita por "caronas", normalmente sucessores desses santos-heróis, protegidos pela heresia da contestação. Assim fizeram com Getúlio e Juscelino; assim farão com Fernando Henrique e Lula; assim fizeram, fazem e farão algumas nações, vendendo suas imagens de salvadoras do mundo... anjos da morte de roupas camufladas.

Mesmo que reconheçamos a singularidade de alguns, se tivéssemos de reconhecer grandes homens, restariam poucos privilegiados como Gandhi e Mandela que, ao contrário desses heróis moldados pelo poder, lutaram em meio às minorias, sem exércitos e sem se transformarem em déspotas. Não criaram sucessores políticos.

"Miserável país aquele que não tem heróis. Miserável país aquele que precisa de heróis." (Berthold Friedrich Brecht)

Separemos o joio do trigo. Não precisamos de heróis... precisamos hoje de senso crítico para contestar o presente e a própria história.




sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

CNJ - a justiça sempre por um fio

Ontem o STF decidiu por 6 votos a 5, manter os poderes de investigação do CNJ. Eu chamaria de decisão histórica se tivesse sido quase unânime, mas infelizmente o que se pode notar é que a nossa justiça salvadora sempre estará por um fio, ou melhor, por um voto. E olha que a pressão popular e da imprensa foram fortes. Assim foi a decisão de ontem, assim foi a da Ficha Limpa e assim serão, pelo visto, todas as decisões que envolverem política, poder e corporativismo. Das duas, uma ou ambas: ou as leis que respaldam nossa constituição são absolutamente confusas ou alguns dos nossos justiceiros togados apresentam sérios problemas de ordem cognitiva. E devem existir outros, mas não me atreveria dizer por falta de provas.

Vamos lá então:
  • A favor dos poderes de investigação do CNJ
  1. Joaquim Barbosa
  2. Ayres Britto
  3. Rosa Weber
  4. Cármen Lúcia
  5. José Antonio Dias Toffoli
  6. Gilmar Mendes
  • Contra os poderes de investigação do CNJ
  1. Marco Aurélio Mello (Relator)
  2. Luiz Fux
  3. Ricardo Lewandowski
  4. Celso de Mello
  5. Cezar Peluso
Um dia antes, o presidente do STF, ministro Cezar Peluso havia dito que a maior prova de que o povo acredita na justiça brasileira eram os mais de 60 milhões de processos que correm. Essa afirmação sem pé nem cabeça é uma prova daquela falta de cognição de alguns togados à qual me referi no início. Oras bolas... o que tem a ver o umbigo com a camisa, pra lembrar um conhecido ditado popular sendo menos vulgar. Mal sabe sua excelência (ou sabe e omitiu) de que esse número de processos seria duas vezes maior se considerássemos as pessoas que desistem pela lerdeza da justiça e as que não têm dinheiro para contratar advogados que estejam à altura dos de seus poderosos carrascos. Fácil, ministro Peluso: ao invés de usar essa sua régua corporativa para medir a satisfação do povo, mande fazer uma pesquisa de opinião.

Outra coisa dita por um desses arautos da sabedoria, é que não se pode transformar a justiça numa instituição desacreditada. Oras bolas outra vez... quem está tornando a justiça desacreditada é ela mesma ao decidir em favor de muitos poderosos e não necessariamente por meio de sentenças, mas também pela falta delas, provocando risco de prescrição de penas como no caso do mensalão.

Assim como o povo está acordando para os roubos do erário, acordaram agora também para a justiça. Que os excelentíssimos não esperem que saiamos às ruas para protestar contra o judiciário, pois, aí sim, será, não o golpe final, mas o início da reconstrução de um país hoje alicerçado sobre a lama da impunidade seletiva.

Será muito fácil um leigo saber se está ou não havendo justiça no país, acompanhando daqui pra frente os votos dos 11 ministros e compará-los às decisões que tomaram ontem. Em certos processos polêmicos e pontuais, confio mais na educação que nossos pais nos deram e no senso de justiça que desenvolvemos do que no tecnicismo sempre inquestionável dos não leigos.

Leia também:

  1. Se cair a ficha, que seja a do supremo
  2. A justiça é cega, mas a injustiça pode ser vista
  3. O STF e sua percepção infra-sensorial
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